Cavera

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Feras do Rock

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

As Novas Rolinhas dos Coronéis

Em 1977, o escritor baiano Jorge Amado brincou com o coronelismo vigente nas regiões Norte e Nordeste do Brasil. Em sua obra “Tieta do Agreste”, o prefeito da pequena cidade era o coronel Artur da Tapitanga, que dava abrigo, comida e alfabetização a algumas meninas em troca de favores sexuais. Elas eram chamadas de pombas-rolas, as famigeradas “rolinhas”. Impossível esquecer a interpretação magistral do monstro sagrado Ary Fontoura (assim diria o Faustão!) para o velho Artur, na adaptação televisiva de 1989. Eis que, em pleno século XXI, os coronéis seguem no poder, agora disfarçados e apaniguados pelo populismo lulo-petista que abraça o Brasil há quase 10 anos. Mas as “rolas” hoje são outras.

A pomba da vez é o centenário Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS). Criado em 1909 como uma inspetoria do governo Nilo Peçanha, ganhou força 10 anos depois quando o paraibano Epitácio Pessoa ascendeu à Presidência da República e queria mais que apenas estudos sobre o semiárido brasileiro: ele queria obras efetivas. Mas seu sucessor, a partir de 1922, o mineiro Artur Bernardes, não deu continuidade e o órgão praticamente desapareceu. Só no final de 1945 recebeu o nome e as atribuições atuais através de um Decreto-Lei do quase desconhecido presidente José Linhares, o primeiro cearense a governar o Brasil, ainda que por apenas 3 meses e 5 dias, atendendo convocação das Forças Armadas após a derrubada de Getúlio Vargas. Até então, Linhares era o ministro-presidente do Supremo Tribunal Federal.

Atualmente, o DNOCS é uma autarquia do Ministério da Integração Nacional, servindo de poleiro para “rolinhas” apadrinhadas de políticos nordestinos e dividindo as manchetes policiais de corrupção com suas “companheiras” de pasta: Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF) e a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE). No governo Lula, o ministério ardeu nas mãos de quatro políticos do Nordeste: os cearenses Ciro Gomes e Pedro Brito (ambos do PSB) e os baianos Geddel Vieira Lima e João Santana (ambos do PMDB). A presidente Dilma Rousseff não mudou a corriola. Em sua gestão, a Integração Nacional foi entregue, de porteira fechada, ao socialista pernambucano Fernando Bezerra (também do PSB).

O DNOCS caiu novamente em desgraça após a crise de poder entre o sedento PMDB, do vice-presidente Michel Temer, e o PT e sua gigantesca base aliada. Por conta do famoso “fogo-amigo”, vazou à imprensa um relatório da Controladoria Geral da União (CGU) que aponta um montante de R$ 312 milhões em corrupção em apenas 3 anos e levaram à demissão a diretoria do órgão, apaniguados de poderosos políticos peemedebistas do Nordeste. Em um gesto público de insatisfação, o líder do PMDB na Câmara, deputado norte-riograndense Henrique Eduardo Alves desafiou a presidente Dilma e questionou: “O governo vai brigar com metade da República? Com o maior partido do Brasil? Vai brigar com quem tem o vice-presidente, 80 deputados federais e 20 senadores? Por que faria isso?” – ironizou, segundo informações dos jornais O Globo e Folha de São Paulo de quinta-feira, 26 de janeiro de 2012.

Mas não datam dos governos Lula e Dilma os escândalos envolvendo o DNOCS e a indústria da corrupção que se ergueu em nome de pseudoideologias sociais no semiárido brasileiro. Como esquecer o caso envolvendo o deputado pernambucano Inocêncio Oliveira (hoje no PR, mas à época no antigo PFL, e em seu 9º mandato consecutivo)? Em 1993, quando era presidente da Câmara, no governo Itamar Franco, Inocêncio foi acusado de utilizar o DNOCS para perfurar três poços artesianos em suas terras, no interior de Pernambuco. Desde 1959, ao lado da SUDENE, o Departamento Nacional de Obras Contras as Secas é responsável pela construção de estradas, ferrovias, eletrificação, entre outras obras, muitas das quais jamais saíram do papel, mas foram diversas vezes pagas com o dinheiro dos impostos dos brasileiros. Junto com a CODEVASF, o DNOCS participa das obras polêmicas de transposição do Rio São Francisco.

O que deveria ser uma importante autarquia do Governo Federal, responsável por levar um pouco de cidadania e bem-estar para os milhões de brasileiros vítimas do fenômeno cíclico das secas que assolam tantas regiões de um país de dimensões continentais, transformou-se num antro de politicagem e roubalheira. Muito além de bandidos corruptos, safados e sem a menor vergonha na cara, os coronéis do século XXI são assassinos. Em nome de benefícios políticos e pessoais, roubam e matam, indiscriminada e diariamente, os sertanejos, outrora fortes, do Polígono das Secas, que compreende nove Estados brasileiros. São bilhões de Reais surrupiados do dinheiro público. Essas são as novas “rolinhas” dos coronéis modernos .

Escritor, Jornalista Político, Palestrante e Conferencista


www.heldercaldeira.com.brhelder@heldercaldeira.com.bR

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